Pequenos negócios

No pós-pandemia, economia solidária é estratégia de sobrevivência

Em Manaus, mais de mil artesãos, distribuídos em praças e galerias dividem espaços e experiências

Lucas Vasconcelos
20/08/2022 às 10:21.
Atualizado em 20/08/2022 às 10:21

Indígena da etnia baré, Albertina Ramos, de 72 anos, descobriu o amor pelo artesanato após se aposentar (Foto: Gilson Melo)

Solidariedade, cooperação e administração coletiva são as principais estratégias da economia após a pandemia do novo coronavírus. Princípios estes já seguidos pela economia solidária amazonense. O segmento consiste nos trabalhadores dividirem seus afazeres em prol do conjunto.

De acordo com o Sebrae Amazonas, o setor movimentou, em 2019, cerca de R$ 3 milhões em todo o Estado. O número de artesãos, segundo informações da entidade, no Amazonas, é de 3.784, sendo 1.384, só em Manaus.

Na capital amazonense, há diversos espaços que reúnem estes mais de mil artesãos e outros trabalhadores atuantes da economia solidária. Dispostos em estandes e galerias localizados em shopping centers, praças e pontos comerciais.

Um destes espaços é o Shopping do Artesanato, localizado na avenida Djalma Batista, próximo a três grandes centros comerciais da capital. Mais de 200 permissionários trabalham de segunda à sexta-feira, das 10h às 17h.

No local, há grandes histórias vividas pelos artesãos que lá atuam. Um grande exemplo é o da artesã indígena da etnia baré, Albertina Ramos, de 72 anos. Nascida em Barcelos, veio para a capital com oito anos de idade. 

Após concluir o ensino médio, conseguiu qualificação para lecionar português em comunidades indígenas e prosseguiu dando aula até se aposentar. E foi na aposentadoria que Albertina descobriu o amor pelo artesanato.

“Depois que me aposentei pensei: ‘Meu Deus o que eu vou fazer? Sou jovem ainda, tenho 40 anos. Tenho que fazer algo’. E andando pelas ruas de Manaus, encontrei uma amiga que me chamou para abrirmos uma banca na Praça Tenreiro Aranha para vender artesanatos. No começo eu não sabia de nada, mas fui aprendendo com essa minha amiga, até me profissionalizar no ramo, que sigo até hoje”, relembra.

Experiência

Com mais de três décadas de experiência em artesanato, Albertina conta que sua especialidade são os trabalhos com penas.

“Comecei com produção de colares de caroço açaí. Mas, hoje o que mais produzo são itens com penas, que vão de cocares, colares, jóias, pulseiras, tornozeleiras, muitos produtos que são para homens, mulheres e até crianças”, pontuou Albertina.

A artesã conta também que seus produtos são vendidos a preços acessíveis para todos os públicos independente das condições financeiras.

“Eu vendo meus artesanatos pensando no cliente. Sei que muitos não tem tanto dinheiro para comprar um cocar, um colar que queira dar de presente para outra pessoa. Geralmente, meu maior público é de turistas mesmo. Mas, eu também faço produtos por encomenda, quando o cliente quer algo maior ou mais detalhado”, destacou a artesã.

Economia coletiva

Outra artesã indígena que também atua de forma solidária é Clenilda Lobo, de 31 anos, da etnia Miriti-tapuya, nascida em São Gabriel da Cachoeira.


Artesã indígena Clenilda Lobo, da etnia Miriti-tapuya, disse que, com o que ganha vendendo artesanato, ajuda nas despesas de casa (Foto: Gilson Melo)

 A artesã que se mudou para Manaus há cinco anos, faz parte da Associação das Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro (AMARN) - uma das mais antigas organizações indígenas do Amazonas e do Brasil.

O grupo foi organizado há mais de 30 anos com o intuito de  promover oportunidades de geração de renda, qualidade de vida e formação sociopolítica para as mulheres indígenas que viviam em situação de isolamento.

Clenilda conta que hoje a Amarn reúne aproximadamente 60 mulheres que vivem da economia solidária pelo artesanato indígena. E que com os ganhos conseguem sustentar suas famílias e também a associação.
 

“Moro com meu marido e duas filhas. Com o dinheiro que ganho do meu artesanato consigo ajudar nas despesas da casa e ainda dar alimento para minhas filhas. Na associação eu aprendi como fazer artesanato, como pegar minha cultura e fazer algo que rende e me sustenta", descreveu Clenilda.

A artesã, que trabalha duas vezes por semana no Shopping do Artesanato, explica que o estande é totalmente compartilhado com outras artesãs. Segundo ela, este é um dos princípios da economia solidária que a Amarn toma como base na hora de empreender.

“Eu divido o espaço com outras artesãs. A gente reveza na hora trabalhar com o atendimento presencial. Os produtos de todas as artesãs estão aqui. Os meus produtos são cestos e potes. Mas, também produzo algumas biojoias. São as que mais vendem. Os turistas se interessam mais”, conta Clenilda.

Espaço

Clenilda ressalta que o espaço é muito bem localizado e que os stands são suficientes para receberem os empreendedores e seus empreendimentos.  Porém, mesmo assim, ainda não recebem tantos clientes como antes da pandemia.

“Desde a pandemia ainda não vi tantas pessoas vindo para cá. A gente consegue vender. Mas tem dias que é fraco. Acho que o falta é uma forma de trazer mais visibilidade. Talvez ter mais edições de bazar ou eventos aqui dentro para trazer mais público”, ressaltou Clenilda.

Para Albertina, reforçar estratégias de campanha para trazer consumidores é necessário para ter um resultado efetivo. Mas, a população deve procurar valorizar os produtos regionais.

“Tem muita gente que ainda não conhece que existem artesãos da própria terra. Preferem comprar coisas importadas. É preciso que nós amazonenses valorizem mais o que a gente mesmo produz”, acrescentou Albertina.

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