Jornalismo Cultural é 99% transpiração
Por Artur Cesar
Muita gente (inclusive colegas de profissão) me diz que a minha vida de repórter (atualmente estou como subeditor do caderno) de cultura é uma maravilha. Convites, brindes e viagens fazem parte do meu dia a dia (na visão deles, é bom deixar claro!). Faz parte, mas não é somente isso. Na realidade aqui é 1% inspiração e 99% transpiração. Eu e meus colegas de bancada, por outro lado, podemos contar alguns bons causos de “ostentação” ao longo de nossas jornadas, como os de ter a chance de entrevistar ídolos nacionais. E por que não dizer, nossos ídolos também.
No último final de semana viajei para São Paulo para cobrir o lançamento da nova turnê de Ana Carolina e Seu Jorge, no Citibank Hall, além da coletiva com eles no dia seguinte. De cara, fiquei empolgado com a missão dada pela minha editora: além de poder curtir esse showzaço e ficar face to face com Ana Carolina – a quem eu nutro uma admiração artística grande –, poderia matar a minha saudade, nem que por poucas horas, de Sampa.
Depois de assistir ao show junto aos meus colegas jornalistas de cultura de outros Estados, fui para a coletiva, marcada para acontecer em uma cervejaria (lá vão dizer: “Que trabalho chato #sqn”). No caso, a cervejaria é do próprio Seu Jorge (a Karavelle, nos Jardins). Ele chegou primeiro ao compromisso. Vestindo uma camiseta branca e uma calça de moletom cinza, cumprimentou todo mundo e explicou que Ana estava atrasada por conta de um engarrafamento.
Fez sua parte de anfitrião e ofereceu suas cervejas artesanais. Alguns colegas aceitaram. “Não me julguem”, disse um ao meu lado. Eu preferi recusar. Estava concentrado matutando as perguntas que poderia fazer (depois uma colega do Recife me ofereceu um gole do copo dela. Muito gostosa realmente, a cerveja!!!). E foi num clima de bate papo de bar que rolou a coletiva.
Antes do compromisso, Seu Jorge aproveitou para matar a saudade da família e engatou uma conversa com a mulher e as filhas (que moram nos EUA) pelo Skype. Depois ele confessou que está longe delas há seis meses por conta dos consecutivos trabalhos. Ana Carolina chegou em seguida. Depois de quase uma hora de entrevista, ambos estavam mais à vontade. Ele sempre disposto a falar mais e com seu copo de cerveja do lado.
Preconceito
Quase no final da entrevista, eles falaram das conquistas das minorias e do longo caminho que ainda falta a ser percorrido na luta contra o preconceito. Ana Carolina destacou que eles representavam duas dessas minorias (o gay e o preto). Seu Jorge lembrou que uma vez foi a um show de Ana Carolina, em SP, como espectador. Lá viu uma cena que o tocou: duas mulheres negras, obesas, beirando os 50 anos, se beijando. “Automaticamente eu pensei: Isso só podia ser aqui. Só aqui para elas se amarem livremente, com tranquilidade, sem julgamentos. Daí eu entendi a importância da Ana”, recordou Seu Jorge.
Ela reforçou que, ao mesmo tempo em que vemos muita gente abrindo a cabeça, é preciso continuar a luta. “Eu vejo mães que vão aos meus shows e dizem: ‘Foi difícil quando minha filha me disse que era gay, mas depois passei a ouvir os teus discos e teus discursos e mudei’. É gratificante ver que estou ajudando de alguma maneira. Não estamos aqui levantando nenhuma bandeira, mas o preconceito existe e deve de combatido”, enfatizou Ana Carolina.
Mais que enfática, ela foi dura: “Nada me tira da cabeça que as pessoas mais preconceituosas são aquelas que têm algum problema com isso e até uma questão embutida ali... Fica quieto meu! Você não tem nada com isso”. Pausa para um gole de água, no caso dela.
Depois de ouvir os dois- musicalmente e expressando suas opiniões-, eu tive a certeza de que tinha vivenciado mais uma experiência bacana dentro da minha profissão. Era hora de voltar para a rotina – em nada tediosa – da redação e produzir o material para o jornal impresso. Não sem antes provar com mais calma da cerveja produzida na Karavelle #momentostentação