Museus sociais: por um direito à memória

Por Taciano Soares, ator, diretor, produtor cultural, professor universitário, Mestre em Cultura e Sociedade e Doutorando em Artes Cênicas pela UFBA.

Taciano Soares
03/01/2020 às 22:19.
Atualizado em 24/03/2022 às 22:09

(Foto: Divulgação)

Entre os aspectos da cultura imaterial está a transmissão de saberes de maneira oral, prática comum nas manifestações populares da música, artesanato, vestimenta, gastronomia, religiosidade, entre outros. A cultura, como identidade de um povo é passada por gerações, sofre influências, mas sempre se renova e se amplia, a partir da palavra falada. Boa parte do nosso idioma hoje, por exemplo, é resultado de variações linguísticas que são confluências dos povos colonizadores-exploradores que nos antecederam. Tudo está sendo modificado e reconstruído, a todo instante.

O Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM) criou os chamados Pontos de Memória que, segundo a própria instituição, consistem na reunião de um conjunto de ações e iniciativas de reconhecimento e valorização da memória social, de modo que os processos museais protagonizados e desenvolvidos por povos, comunidades, grupos e movimentos sociais, em seus diversos formatos e tipologias, sejam reconhecidos e valorizados como parte integrante e indispensável da memória social brasileira. Tem como objetivo principal contribuir para o desenvolvimento de uma política pública de direito à memória, com base no Plano Nacional Setorial de Museus e Plano Nacional de Cultura.

Experiência:

Em 2018, ogoverno do estado do Espírito Santo, em parceria com a Rede de Museologia Social do Rio de Janeiro, realizou o Encontro Teia da Memória que é uma experiência muito interessante sobre museologia social, onde reúne pontos de memória, museus comunitários, ecomuseus, pesquisadores e professores das áreas correlatas, entre outros, para discutir essas ações que vão ao encontro direto do fomento à memória, como identidade cultural.

O estado do Amazonas, considerando sua capital Manaus, ainda não possui iniciativa nesse sentidopor parte de uma política pública integrada à universidade, como produção de conhecimento e aos coletivos museais locais, mas fica como reflexão a possibilidade de tê-lo e, com isso, caminhar em favor de ações continuadas que impactem na consideração da memória cultural como raiz de uma sociedade.

Para refletir:

Será que, a partir de uma catalogação dos saberes tradicionais nas cidades do Amazonas e comunidades de Manaus, não poderíamos pensar em modelos que estimulassem essa prática aqui também? A museologia social tem trabalho muito bem o diálogo entre a universidade e a sociedade organizada, a fim de encontrar saídas para o registro das memórias culturais sem interferir nas suas formas de acontecimento, mas encontrando possibilidades de não deixa-las no risco de serem perdidascom o tempo.

É fundamental para uma sociedade conhecer a si, sua história, seu conhecimento transmitido por gerações, para que não construamos um futuro sem passado. O uso da tecnologia nos permite aproximar, cruzar e trocar informações com o mundo, mas esse mundo também tem sido considerado dentro dos estados e das comunidades? Podemos pensar que a museologia social é um convite à sociedade para criar suas próprias narrativas, considerando diferentes grupos que não tiveram oportunidade de narrar e expor suas histórias, memórias e patrimônios nos museus tradicionais.

Imaginemos, com isso, a quantidade de povos indígenas que o estado possui com suas mais diversas manifestações culturais que definem sua existência, modos de pensar e ser, assim como as comunidades quilombolas (já reconhecidas e as que estão em processo de reconhecimento) e todos os povos da floresta, em sua infinidade de saberes sendo alcançados por um modelo de trabalho que os resgate ao foco principal da história? É um desejo possível e, apesar de recente, já temos iniciativas inspiradoras em diversas partes do país.

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